Nação amordaçada

por Laudelino Sardá


Brasil – A ditadura militar, que usava a bandeira nacional como estratégia para a propagação de seus ideais, induziu a massa popular, que luta em defesa do retorno da democracia, a não usar o estandarte brasileiro em manifestações de rua. Assim, por exemplo, foi a passeata dos cem mil no Rio de Janeiro em junho de 1968, organizada pelo movimento estudantil, mobilizando artistas, intelectuais e outros segmentos da sociedade. Só havia panos com recados à ditadura. Mas quando o governo se fazia presente em manifestações, solenidades ou em encontros da Arena, predominava a bandeira nacional.
O governo de Jair Bolsonaro, que lampeja o retorno da ditadura como alternativa para a Nação, repete o mesmo cenário. E o Dia Internacional do Trabalhador acabou colorindo avenidas com a bandeira nacional, numa manifestação bolsonarista. Essa similaridade entre o período da ditadura e o momento político-partidário, que secciona o sentimento de brasilidade para entoar o brasileirismo como estratégia eleitoral, descaracteriza o país, justamente porque esses segmentos políticos que se antagonizam – bolsonarista e lulista – não se identificam com os ideais da Nação; eles poderiam estar em outro país, porque seus discursos não visam a um Brasil melhor, mas cegamente à conquista do poder.
O Brasil aguarda, com certa ansiedade, outras opções de discursos, que demonstrem, através de propostas convincentes, preocupação e saída para as crises institucionais, sociais e econômicas. Mas o que se denota é que os políticos estão em seus pedestais arrotando vantagens, enquanto o povo quer atitudes e convencimentos, principalmente contra os desvios de dinheiro público para cofres pessoais ou de grupos. Aliás, a corrupção, uma herança do Império (D. João VI esvaziou os cofres do Banco do Brasil ao retornar a Portugal), se transformou em jogo de denúncias, como se não houvesse obrigação de justificativas e provas. Os políticos são incapazes de falar sobre corrupção, justamente porque vivem sob a custódia de um judiciário incapaz de punir.
Nesse jogo de neurose política, a oposição ao governo é chamada de “esquerda”. A propósito, o regime militar também identificava os opositores de esquerdistas, e alardeava quando prendia um comunista. Mas, infelizmente, a esquerda mergulhada em política partidária é, sobretudo, burra, sem argumento e proposta. Há bons pensadores de esquerda no Brasil, mas não se ouve bons políticos de esquerda. Lula faz o seu papel de aglutinação das oposições, enquanto Bolsonaro joga para uma plateia encantada com seus ataques ao STF e ao Legislativo. O cenário é de indefinição, mesmo com Lula liderando as pesquisas, pois as eleições serão só em novembro. O que não pode, contudo, é a Nação viver amordaçada por discursos imbecis, omissões ordinárias e candidatos que não enxergam o sofrimento dos brasileiros.

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