Minha Opinião | Raquel Gallinati


PROTEÇÃO EFETIVA PARA AS MULHERES, UMA NECESSIDADE URGENTE
por Raquel Gallinati
Delegada de Polícia, Diretora da Associação dos Delegados de Polícia do Brasil e embaixadora do Instituto Pró-Vítima

A violência contra a mulher se estabelece como uma das principais formas de violação dos direitos humanos, e, como tal, é também um desafio real para a polícia e para as políticas públicas.
A Lei nº 11.340/06, conhecida por todos como a “Lei Maria da Penha”, que criou mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, representou um enorme avanço na luta em prol dos direitos da população feminina desde que foi sancionada, visto que tem o poder de impedir o convívio do agressor com a vítima por meio de medidas protetivas.
Porém, a despeito de termos no Brasil uma das 5 melhores leis do mundo nesse quesito, ainda assim estamos figurando nas primeiras colocações no ranking mundial como um país violento para mulheres.
Vejamos: o Brasil é o quinto país do Planeta em ranking de violência contra a mulher, atrás somente de El Salvador, Colômbia, Guatemala e Rússia, de acordo com dados do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH). Uma realidade trágica, lamentável, vergonhosa.
Milhares de mulheres são mortas no Brasil mesmo estando resguardadas por medidas protetivas e com inquéritos abertos contra seus algozes. Todos os dias, são Marias, Anas, Cláudias, Verônicas e tantas outras, que, muitas vezes, pagam com suas vidas só por serem mulheres.
Proteger a vítima de violência doméstica é uma necessidade urgente, e o agressor precisa saber que a mulher está amparada e protegida pela lei de maneira efetiva, mesmo que a ocorrência não seja registrada em flagrante.
O problema é que o agressor, na maioria dos casos, é o companheiro e a violência ocorre dentro de casa. A rotina doméstica violenta começa gradativamente, com gritos, xingamentos e agressão física. Muitas vezes, acontece por longos períodos, por ciúme e sentimento de posse. Quando os casos chegam a público, o pior aconteceu e muitos casos já entraram nas estatísticas de feminicídio. É um roteiro conhecido e repetitivo. Triste, porém real.
É preciso cortar o ciclo de violência desde o início, o que nem sempre é fácil para a vítima. Por isso, temos de agir, educar e proteger, até que a sociedade entenda que o homem não é dono da mulher e não tem direitos sobre ela.
Algumas medidas podem interromper o ciclo violento. Entre elas, a atenção aos primeiros sinais, como agressão verbal, ciúme, necessidade de controle por parte do companheiro. Também é importante o engajamento de todos, ou seja, que as pessoas próximas fiquem atentas, pois assim a denúncia contra o agressor poderá ser realizada mais rapidamente – muitas vezes, a mulher está emocionalmente envolvida e demora para denunciar ou pedir ajuda.
Combater a repetição de estereótipos de gênero é outra questão fundamental. Estereotipar a mulher, um comportamento que culturalmente ainda é aceito, infelizmente, em nossa sociedade, acaba por reforçar atitudes machistas, que podem incluir a violência.
Outra medida que se faz necessária é a criação de uma rede de proteção à vítima para que ela possa fazer denúncia mais facilmente, com mais segurança, por saber que tem pessoas de confiança a quem recorrer.
Em casa, a mulher não pode se sujeitar à violência por medo. É preciso pedir ajuda a vizinhos, amigos e familiares. O telefone 180 atende casos de violência contra a mulher.
Às mulheres que se encontram nessa situação, deixo aqui mais uma recomendação: quando se sentirem em risco, se dirijam a uma delegacia, denunciem, antes que seja tarde demais e figurem nas estatísticas de mais vítimas de feminicídio.
Recentemente, foi sancionada, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), lei que obriga as Delegacias Especializadas no Atendimento à Mulher a funcionarem de forma ininterrupta em todo o País. O tema vem repercutindo nos últimos dias.
A ideia, de certa forma, é boa. Como vimos, o Brasil apresenta estatística vergonhosa de assassinatos de mulheres – sem falar de agressões, estupros e todo tipo de violência. No papel, a lei é bonita. Na prática, são outros quinhentos. De que adianta abrir uma Delegacia da Mulher se não tem equipe suficiente, e formada por profissionais femininas, para trabalhar nela?
O que as vítimas querem, e precisam, é de proteção efetiva, que funcione para valer, que resguarde, e faça valer, acima de tudo, seu direito à vida.


Foto: Divulgação