Entrevista | Cesar Lunkes

por Plinio Ritter – @plinioritteroficial


Presidente da AMPESC afirma que é preciso estabelecer um fundo garantidor único para assegurar pagamento de bolsas a alunos carentes.
Os dois projetos de lei que estabelecem novas regras de financiamento do ensino superior de Santa Catarina – PLC13, Universidade Gratuita (UG), e PLC 162 (bolsas estudantis) – estão previstos para serem votados na Assembleia Legislativa na próxima terça-feira (dia 11). Nos últimos dias, após a apresentação recorde de emendas – 155 –, desenhou-se um acordo entre partidos e Governo, modificando alguns pontos. “Houve avanços, sem dúvida, mas são necessários ajustes em questões ainda não totalmente esclarecidas”, afirma o professor Cesar Lunkes, presidente da Associação das Mantenedoras Particulares de Educação Superior de Santa Catarina (AMPESC), entidade que reúne 70 das 84 instituições de ensino superior (IES) privadas particulares do Estado, que congregam cerca de 300 mil alunos. A seguir, a entrevista concedida com exclusividade para o jornalista Plinio Ritter.

Plinio Ritter: Como o senhor vê o acordo que está sendo costurado entre as lideranças da Assembleia Legislativa e o governo para aprovação dos projetos?

Cesar Lunkes: Percebemos que houve alguns avanços, entre eles, por exemplo, a questão da transparência, com a necessidade do Sistema Acafe ter de tornar público os salários pagos, incluindo os dos reitores, e que a remuneração também terá de obedecer o teto da Constituição Federal. A fiscalização pelo Tribunal de Contas do Estado também é outro ponto importante. Mas ainda são necessários muitos ajustes e esses são, quase que na totalidade, de pontos duvidosos, não esclarecidos totalmente. Outro exemplo: fala-se muito da divisão dos recursos, sendo que os percentuais que devem ser aprovados serão 75% para o Sistema Acafe e 25% para as instituições de ensino superior (IES) privadas particulares. No entanto, ainda não está claro se esses 25% serão destinados somente às bolsas de graduação, porque a redação original do art. 4º prevê que seja destinado para pagamento de mensalidades de cursos de graduação e pós-graduação oferecidos por instituições de ensino superior mantidas por pessoas jurídicas de direito privado e outras instituições universitárias. Há ainda os incisos 1º e 2º do Artigo 12, que determinam que 50% dos recursos irão para as bolsas de graduação, enquanto os outros 50%, “para pagamento de quaisquer outros benefícios de assistência financeira a estudantes regularmente matriculados em cursos de graduação ou pós-graduação”. Em outras palavras, quer dizer que, além do UG, as instituições da Acafe poderão ter acesso às bolsas de estudo da pós-graduação e extensão. Nossa atuação tem sido para que os recursos a serem destinados para as bolsas de estudo dos alunos das instituições privadas particulares – o que irá, efetivamente, garantir o aumento prometido pelo governo.

Ritter: Há outros pontos críticos?

Lunkes: Acredito que temos mais pontos críticos do que esclarecidos, e o número recorde de emendas que o projeto recebeu na Assembleia, pelos deputados, é prova disso. Como é prova também o relatório apresentado pelo Tribunal de Contas, questionando, entre vários problemas, a falta de indicação da origem orçamentária dos R$ 1,4 bilhão em recursos necessários para viabilizar as propostas. E a questão orçamentária é justamente outro ponto que temos tentado chamar a atenção dos deputados: a distinção feita em relação às fontes de recursos que irão custear os dois programas, deixando mais uma vez os alunos das privadas particulares na incerteza de receber efetivamente as bolsas. Isso porque o PL 162 está baseado no Fundo Estadual de Apoio à Manutenção e ao Desenvolvimento da Educação Superior (FUMDES), o qual exigirá aporte de verbas, sem a garantia orçamentária estar clara e determinada no texto – ao contrário do UG. Nesse caso, a nossa proposição é que os dois projetos tenham uma fonte garantidora única.

Ritter: Na sua opinião, qual é um modelo mais democrático de acesso ao ensino superior?

Lunkes: É um modelo diferente do proposto pelo governo, que fosse um programa justo socialmente, que garantisse tratamento aos estudantes com base no critério de carência do aluno, independente da instituição que ele escolheu estudar. Porque essa é uma escolha do cidadão, que vai levar em conta seu trabalho, sua moradia, enfim, sua vida. Uma vez o estado decidindo aportar recursos para apoio financeiro ao aluno, é o sonho do aluno que precisa ser respeitado. Que os recursos beneficiassem alunos e não instituições, como a gente diz, que fosse para o CPF e não para o CNPJ, e isso está lá, no artigo 2º do UG: “os recursos distribuídos sob forma de assistência financeira às instituições universitárias….”. O que temos hoje é uma proposta excludente, já que deixa de fora 300 mil estudantes, justamente aqueles que mais precisam, oriundos em sua maioria de escolas públicas e com renda mais baixa.

Ritter: O governo defende a escolha da Acafe dizendo que as IES vinculadas não têm fins lucrativos e que a qualidade do ensino é melhor. O que o senhor tem a dizer, nesse sentido?

Lunkes: É preciso esclarecer que os nos dois modelos – privadas sem fins lucrativos (com ou sem filantropia, comunitárias e confessionais) e privadas com fins lucrativos –, os alunos pagam mensalidade e, nesse caso, nosso ticket médio é cerca 40% menor do que o do Sistema Acafe. E o governador disse, com todas as letras, na audiência pública, que o projeto visa ajudar instituições ligadas à Acafe, e isto está confirmado no Art. 2º. do Projeto UG. Sobre a qualidade do ensino, no início do ano o MEC divulgou os conceitos de todas as universidade e faculdades do País. Em Santa Catarina, das 10 melhores, cinco são privadas particulares, quatro públicas e somente uma do sistema comunitário. Quem visitar e perguntar aos alunos de nossas faculdades, centros universitários e universidades sobre qualidade e serviços vai claramente confirmar a qualidade atestada pelo MEC.

Ritter: Outro argumento do governo em favor do projeto é a contrapartida que as IES vinculadas à Acafe irão oferecer.

Lunkes: As universidades comunitárias são instituições privadas criadas pelo poder público e administradas sob as regras da iniciativa privada – não realizam concurso público nem se submetem as exigências de licitação para contratar serviços e produtos. Em sua maioria, são filantrópicas, ou seja, não pagam uma série de impostos, com a obrigação de prestar serviços à comunidade – logo, é mais que natural que o façam, caso contrário, estariam incorrendo em apropriação indébita. Já as faculdades e universidades privadas particulares são constituídas a partir do credenciamento do Ministério da Educação e fiscalizadas previamente e regularmente. Todas as condições e opções quanto à tributação são apresentadas e se o MEC entender que adequadas, a IES é aprovada. Sobre mensalidades, salários e outras receitas, as IES particulares pagam regularmente os impostos devidos, sendo que a inadimplência pode ocasionar o descredenciamento da mesma. Em muitos municípios catarinenses, a faculdade privada particular é a maior contribuinte de ISS – enquanto que as IES comunitárias nada pagam deste imposto. Estima-se que são recolhidos anualmente mais de R$ 23 milhões somente em ISS pelas IES privadas particulares.
Em relação aos serviços gratuitos essenciais, no caso da AMPESC, são mais de 400 mil atendimentos/ano, nas diversas áreas do conhecimento, como jurídica, de saúde e educação, por exemplo. Na formação de professores, as IES ligadas à AMPESC ofereceram 93% dos cursos de licenciatura (dados de 2020). Este volume de serviços poderia ser ainda maior se, nos últimos 20 anos, houvesse alocação isonômica dos recursos já que mais alunos beneficiados com o UNIEDU poderiam ter contribuído com a sociedade catarinense.